segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

O Rei Eleito



                   



por Andréa Faggion em março de 2009
Alguém disse que o Estado não seria composto apenas por três poderes, haveria um quarto: a imprensa. Na verdade, o quarto poder seria aquele a legislar soberano sobre os outros três, julgando a todos diante dos olhos do público para que este, docilmente, executasse sua vontade. Assim, a imprensa que derrubaria presidentes pelo "Jornal Nacional" também faria seus deputados em "O Globo", contando uma história até que, repetida muitas vezes, ela se tornasse verdade.

A imprensa contou a história de Michael Jackson, o menino negro de infância difícil que, pelo talento genial, conquistara as maiores glórias, para então ser condenado por ousar realizar sonhos com os quais simples mortais não ousariam fantasiar. Enlouquecido pela fama, com a sanidade, o menino perderia também a felicidade e veria escapar de suas mãos, uma a uma, todas as suas conquistas. Morreria obscuro para que cada um de nós, diante de seu exemplo, não ousasse querer voar tão alto.

Tudo estava sacramentado...

Como explicar então centenas de milhares de ingressos vendidos em instantes? O sucesso não seria reservado àqueles que as revistas da moda apresentam como símbolos do poder?
É de se notar que o velho "falem mal, mas falem de mim" é estratégia de marketing desde que esta palavra passou a fazer parte do vocabulário do mundo das celebridades, artistas que não fazem arte, como diz o outro. Arrebente um carro ou a cara de sua namorada e seja coroado Rei do Pop da semana, porque só assim a tia Maria, que não escuta Joven Pan, vai saber que você existe. Mas e quando dizem, repetem, ressaltam, insistem, enfatizam... que você está acabado, que não é nada cool gostar de você, o comedor-de-criancinhas-falido-à-beira-da-morte? Isto é boa publicidade?

Parece que nem um pouco! Mas como explicar então que nenhum garotão ditador de moda seja "o cara" a vender centenas de ingressos por minuto, mas sim o has been cinquentão? Parece até que isto que emblematicamente chamamos de "massa" não é tão manipulável assim. Ela foi capaz de perceber-se, sem ajuda nenhuma, diante do momento histórico em que o sucessor de Fred Astaire, que, por sua vez, não deixará nenhum sucessor, encerrará de uma vez por todas a chamada "época de ouro" de Hollywood.
A "massa", por si mesma, deu-se conta de que quando Michael Jackson descer do palco pela última vez, nunca mais veremos um homem espetáculo em ação. Ela sabe que as novas coreografias ainda serão imitadas vinte anos depois, que os novos efeitos se repetirão em todos os shows, mas ela reconhece desde já que cada show futuro de garotas problemáticas ou rapazes esquentadinhos, que seguirão os passos de um só mestre, será apenas um simulacro do verdadeiro espetáculo. Só com ele, ainda teremos a emoção da expectativa do novo, do nunca antes visto. Só com ele, a parafernália eletrônica, os efeitos especiais, o cenário, os figurinos... serão o veículo do talento, da magia... não seu sucedâneo.

Quando a voz de Michael Jackson ecoar pela primeira vez na Arena O2 em Londres, ficará claro que o quarto poder, por inexplicáveis razões, na verdade, nada pode, nada importa... Verdadeiros soberanos são eleitos pelo povo, ainda que sejam reis.


Fonte:
MJ Beats | MJJ Secret Lovers

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