Revista Veja, 6 de outubro de 1993.
Com os espetáculos de Michael Jackson e de Madonna, o Brasil entra com vigor na rota milionária da música pop internacional
No final da próxima semana, um brado retumbante de guitarras irá soar no estádio do Morumbi, em São Paulo, para anunciar que se abriu uma nova era no país. No momento em que Michael Jackson chegar ao centro do palco, o Brasil estará ingressando no mundo desenvolvido da música popular internacional. Não é Frank Sinatra de peruca e com retalhos de sua voz maravilhosa no Maracanã. Também não é Paul McCartney, gorducho, cabelos embranquecendo, em companhia da patroa milionária em vez de John, George e Ringo. É Michael Jackson em grande forma. Em duas exibições, ambas em São Paulo, ele apresentará o show que confirma sua condição de maior estrela da música popular deste século, que vendeu discos como ninguém e ganhou dinheiro como nenhum outro.
Não será uma atração solitária neste alegre fim de ano aos brasileiros. Duas semanas depois, Madonna pisará no mesmo Morumbi, para em seguida levar sua ambição loura ao maior estádio do mundo, o Maracanã. "Os brasileiros vão ver um espetáculo que nunca tinham sequer imaginado", afirma Marcel Avram, dono da Mamma Concert, responsável pela venda do espetáculo de Michael Jackson fora dos Estados Unidos. Não viram mesmo. Até há pouco, o Brasil era uma espécie de INSS do show biz internacional. Só costumava ser lembrado no momento em que se queria reforçar a aposentadoria de grandes estrelas em final de carreira. Outra possibilidade era a apresentação de atrações de sucesso fugaz, como Guns N' Roses e Prince, a bordo de festivais como Rock in Rio e Hollywood Rock.
INVESTIMENTO MULTINACIONAL - Até que foi bom, mas nada que se compare aos nomes que estão para chegar. Em função do tamanho de suas platéias, e também dos recursos milionários que envolvem suas apresentações, Michael Jackson e Madonna são estrelas com outro quilate e brilho. E trazem ao Brasil um conceito diferente de show que só os dois são capazes de apresentar. Não é mais música - e é por essa razão que os críticos assistem a seus espetáculos, e vão para casa resmungando, enquanto o público fica até o final, e vai embora festejando. É um megaespetáculo, com cenários mirabolantes, truques mágicos de primeira, efeitos especiais tão bons que o palco fica parecido com uma tela de cinema e as coreografias têm o profissionalismo da Broadway.
Os dois são grandes representantes de uma geração de artistas para quem a música deixou de ser um ramo da indústria do entretenimento, transformando-se num negócio que movimenta bilhões de dólares pelo mundo afora e tem a fisionomia de um investimento multinacional. Os números de gasto e faturamento de suas excursões são gigantescos. Na abertura da turnê
Girlie Show de Madonna em Londres, na semana passada, cobrou-se um preço médio de 35 dólares o ingresso. Como 72.000 espectadores compareceram ao estádio de Wembley para ver a cantora - entre eles a princesa Diana -, foram arrecadados, só em bilheteria, cerca de 2,5 milhões de dólares. É uma cifra suficiente para pagar cachês de dez shows de Prince no Brasil, por exemplo.
TESTADO E RETESTADO - Calculando que cada show rende um mínimo de 2 milhões de dólares, a turnê
Girlie Show, que tem 32 escalas, movimentaria por baixo a quantia de 64 milhões de dólares. Aplicando o mesmo cálculo a Michael Jackson, após as duas fases da turnê de
Dangerous - a primeira no ano passado, a segunda em 1993 - cerca de 200 milhões de dólares serão arrecadados só com a bilheteria. Parte desse dinheiro vai para o bolso dos artistas, cujos cachês variam em média entre 500.000 e 700.000 dólares (Madonna) e 800.000 e 1,5 milhão de dólares (Michael Jackson). Parte vai para os organizadores e pessoas envolvidas na produção.
Ao armar a lona de seu circo multimilionário, turnês com essa magnitude também movimentam uma imensa rede de negócios paralelos. O mercado de discos é o exemplo mais óbvio. Nas semanas que precederam o show de Michael Jackson em Madri, no final do ano passado, a vendagem do LP
Dangerous quintuplicou. Passou de 50.000 para 250.000 cópias. Há também os lucros com merchandising - venda de bonecos, camisetas e artigos afins na temporada que antecede o show e durante a apresentação. Nos Estados Unidos, há uma estimativa de que cada fã americano que vá a um estádio gaste 17 dólares com artigos desse tipo. Ou seja: cada espectador acaba consumindo, em bugigangas que leva de recordação para casa, o valor de mais meio ingresso. Num estádio médio, o faturamento só nessa área pode chegar a 1 milhão de dólares por show. Parece muito, e é, mas só durante um mês de ensaio antes de cair na estrada com a turnê a produção de
Dangerous gastou 1,2 milhão de dólares.
Outro dado vem do patrocinador. Em algumas escalas de Dangerous, como Bagcoc e Cingapura, o consumo de Pepsi, marca de refrigerante que patrocina o cantor, cresceu cerca de 18% na época do show. Dona de 32% do mercado americano, contra 43% da veterana Coca-Cola, a Pepsi atribui seu desempenho à teimosia com que patrocina roqueiros, uma lista que já foi frequentada por Tina Turner, Lionel Ritchie e pela própria Madonna. No Brasil, a empresa está investindo 4 milhões de dólares em Michael Jackson. A Antarctica, patrocinadora de Madonna, orçou apenas seus gastos com a produção do show, sem incluir as verbas de publicidade, em 1,2 milhão.
GLOBALIZAÇÃO - Envolvendo interesses de tal ordem, um show como esse transforma espetáculos do passado em lembranças românticas. Das antigas apresentações, resta apenas a voz da estrela - que é ao vivo, ainda. Cada movimento é cronometrado, todos os gestos são ensaiados com antecedência e até os contatos diretos com o público, quando ocorrem, são promovidos em clima de grande profissionalismo. É tão grande o investimento e, proporcionalmente, tão grande a expectativa de retorno que não se poder correr o risco de um fracasso.
É a natureza monetária dessas turnês que explica o fato de elas terem chegado a um país como o Brasil. Na realidade, seus custos se tornaram tão elevados que não cabem mais nas fronteiras dos países desenvolvidos, ainda mais agora, quando Estados Unidos e Europa amargam uma recessão econômica. "Artistas como Michael Jackson e Madonna vivem uma fase de mundialização de suas carreiras", analisa Roberto Augusto, presidente da gravadora Sony Music no Brasil. Isso não aconteceu por opção, mas por necessidade. Há vinte anos, o público americano consumia metade de todos os discos produzidos no mundo. Hoje, esse número caiu para um terço.
O mercado também se tornou mais competitivo. Madonna e Michael Jackson são dois colossos sem comparação. Em 1992, no entanto, venderam menos discos nos Estados Unidos do que o cantor country Garth Brooks, uma espécie de Chitãozinho e Xororó em inglês. Também não param de surgir novas atrações para aquele público que, além de comprar discos, também adora sair de casa para assistir, ao vivo, a uma apresentação de seu cantor predileto. Michael Jackson tem concorrentes até na família, com sua irmã La Toya. "Antigamente, nos Estados Unidos, na Europa e no Japão, as pessoas iam a um concerto por semana", teoriza o americano Ken Graham, coordenador da montagem do show de Michael Jackson no Brasil. "Hoje em dia não têm mais dinheiro e são obrigadas a escolher, o que diminui consideravelmente o mercado." Em sua turnê, Madonna fará só quatro apresentações nos Estados Unidos, onde não é novidade para a maioria das platéias, três no México, onde também se apresenta pela primeira vez, e duas no Brasil. Originalmente, Michael Jackson faria três apresentações no Brasil, a terceira no Rio de Janeiro. Preferiu trocá-la por uma praça diferente e vai para o Paraguai.
ROCK, SUOR E DINHEIRO - Os fãs de Michael Jackson que não moram em São Paulo também poderão assistir aos shows do ídolo. A rede de lojas C&A, num acordo operacional com os organizadores do evento, está comercializando ingressos para o público. Nas cidades onde não há loja C&A, pode-se recorrer ao telefone mais próximo ou procurar uma agência de viagens. A produção mantém um serviço telefônico especial para atender aos interessados. Os ingressos podem ser obtidos pelos telefones (011) 829-2988 ou (011) 820-3622. Eles estão sendo vendidos em pacotes, para um mínimo de vinte pessoas. O procedimento para adquiri-los é simples. O responsável pela caravana faz o pedido e recebe por fax, em contrapartida, uma ficha de cadastro a ser preenchida com os dados básicos, como endereço e telefone para contato. Depois, ele deve depositar o valor total da compra numa conta especial. Confirmado o pagamento, a organização envia os ingressos por via aérea.
A produção do show de Madonna adota procedimento semelhante. Os ingressos estão sendo vendidos em quiosques espalhados pelos shoppings mais importantes do Rio de Janeiro e de São Paulo. Quem mora em outra cidade também conta com o apoio de um serviço telefônico especial. Os organizadores da turnê
Girlie Show atendem ao público do país inteiro em São Paulo, através dos telefones (011) 883-7857 e (011) 822-8038. O interesse pelos espetáculos tem atraído caravanas de fãs de cidades como Blumenau, Florianópolis, Curitiba, Brasília, Belo Horizonte e outras do interior do Estado de São Paulo.
CORAJOSOS - Em Porto Alegre, por exemplo, três agências de turismo estão organizando grupos para assistir aos megaconcertos. O movimento não é pequeno. Até a semana passada, haviam sido vendidos 160 pacotes de excursões para o show de Michael Jackson e outros 640 para os espetáculos de Madonna no Rio e em São Paulo. Partindo do Rio Grande do Sul, custam, em médio, 115 dólares para o show de Madonna e 110 dólares para o de Jackson. Além da viagem em ônibus semileito e do ingresso, o pacote dá direito a um pernoite em hotel quatro estrelas, com café da manhã. Nessa região do país ainda existe a opção de ver Michael Jackson em Buenos Aires. Por 200 dólares, ganha-se um ingresso de arquibancada, viaja-se de ônibus-leito e também se tem direito a três noites de hospedagem num hotel três estrelas, com café da manhã e jantar. Há ainda a turma dos corajosos. Eles enfrentarão 1.100 quilômetros de Porto Alegre a São Paulo, assistem ao show e retornam na mesma noite - uma maratona ininterrupta de 46 horas.
A paixão gaúcha por Michael Jackson não chegar a ser uma unanimidade nacional. Das três lojas C&A de Salvador, por exemplo, apenas uma colocou à venda ingressos para o megashow, ainda assim sem sucesso. "Está meio parado, mesmo", admite o balconista Dailton Santos. O único fã-clube expresso de Michael Jackson de Salvador, o Dream Fã-Club, foi o responsável pela única promessa de vendas (45 ingressos) e anunciu a formação de uma caravana. O participante paga 8.000 cruzeiros reais, mais o ingresso. "Os baianos parece que gostam demais de axé music e discriminam a música do Michael", diz Miguel Marcelo de Menezes, presidente do fã-clube. "Mesmo assim, a gente vai ferver em São Paulo", garante o sósio do cantor e membro do fã-clube Ciro Meirelles. A rádio Itapoã FM, também de Salvador, fará uma promoção para sortear 43 passagens de ônibus-leito para ver Michael Jackson em São Paulo. Um dos premiados terá o privilégio de tirar uma foto ao lado do ídolo. É uma chance que estará reservada a apenas cinco brasileiros entre os milhares que irão assistir ao espetáculo. "Temos um contrato com a Sony Music e a Pepsi-Cola para incluir um baiano entre os cinco que poderão falar com Michael", diz Luís Henrique Reis, coordenador da programação da emissora. A mesma rádio pretende levar, por concurso, vinte pessoas de avião para o show de Madonna em São Paulo e 23 para o do Rio, em ônibus-leito, com direito a hospedagem e ingresso de arquibancada.
Os vips também poderão assistir aos shows com seus lugares especiais. No caso de Michael Jackson o esquema já está pronto. Além do seleto grupo de convidados dos promotores do espetáculo, estão sendo colocados à venda ingressos para o setor chamado Hospitality Center, cujo ingresso, com direito a jantar e bebidas, custará 450 dólares. A empresa que realizará o bufê é a mesma que faz esse serviço no Carnaval carioca e na Fórmula 1. As velhas cabines de imprensa e rádio do Estádio do Morumbi também serão transformadas em camarotes Master, com serviço de lanche e bebidas, com ingressos cobrados a 150 dólares. Um camarote fechado custa 15.000 dólares. Será estabelecida, em caráter opcional ao preço de 200 dólares por passageiro, uma linha de helicópteros para servir aqueles que quiserem - e puderem - ficar livres do trânsito na região.
Os shows de Michael Jackson e Madonna oferecem, obviamente, opções para os diversos bolsos. Para o espetáculo de Jackson do dia 16, por exemplo, a arquibancada sai por 2.000 cruzeiros reais e a pista, por 3.000. Já as cadeiras do piso superior variam de 5.300 a 7.300 cruzeiros reais. O show de Madonna em São Paulo tem preços um pouco mais caros. A arquibancada sai por 2.200 cruzeiros reais, o gramado por 3.200 cruzeiros reais, a cadeira superior por 5.500 cruzeiros reais e a cadeira especial do setor vip por 19.000 cruzeiros reais. No Rio de Janeiro, a arquibancada vale 1.800 cruzeiros reais, o gramado, 2.600 cruzeiros reais, a cadeira superior, 3.100 cruzeiros reais, e a cadeira especial do setor vip, 18.500 cruzeiros reais.
ESNOBISMO E DESCULPAS - No passado, quando o faturamento doméstico estava garantido, artistas de primeira linha gostavam de esnobar ofertas internacionais, ainda mais quando partiam de empresários interessados em trazê-los ao Brasil. "Eles arrumavam as desculpas mais folclóricas, chegando a dizer que temiam que seus equipamentos fossem roubados," lembra-se o publicitário Roberto Medina, que, como promoter do Rock in Rio, se tornou um pioneiro nessa área. "Agora, não é mais assim." E não é, também, porque em fase de dinheiro curto, se descobre que até o Brasil pode tornar-se um tesouro interessante. Com 32 milhões de LPs, CDs e fitas cassete vendidos em 1992, o país é o nono maior mercado musical do mundo. Está na frente da Itália, da Espanha, da Bélgica e da Austrália. E isso em função da recessão. Em 1989, foram vendidos 78 milhões de discos no país de José Sarney.
Outra novidade é a situação econômica de boa parte da América Latina. "Em países como a Argentina e o Chile, o ingresso pode ser vendido a preços europeus, ou seja, entre 35 e 40 dólares", contabiliza o empresário brasileiro Dody Sirena, dono da DC-7, uma das promotoras do evento Michael Jackson no Brasil. Existe um consolo no país da inflação, do pão de queijo e do Fusquinha. O espectador tem direito a um ingresso ao custo médio de 14 dólares, cerca de 1.800 cruzeiros reais, caríssimo para os padrões brasileiros - mas, convenhamos, uma mixaria em comparação até mesmo com o que será pago na vizinhança. Em parte, essa vantagem nacional se explica pela demografia. Se Michael Jackson conseguir lotar o Morumbi duas vezes, a platéia terá deixado, só nas bilheterias, a soma de 2,4 milhões de dólares - exatamente o dobro de tudo aquilo que irá receber dos organizadores a título de cachê. Como resistir a um investimento tão rendoso?
Outro fato é que caravanas de artistas internacionais são como vôos de uma companhia aérea. Sempre ocorrem escalas, e o fundamental não é definir o preço de cada trecho da viagem, mas saber se, no destino final, o número de assentos ocupados será suficiente para pagar a conta. A maioria dos espetáculos é negociada na forma de pacotes continentais, e assim platéias menores, mas mais endinheiradas, como as da Argentina e do Chile, pagam mais que as maiores e mais empobrecidas. O ingresso é mais caro e, às vezes, o cachê também é diferenciado. Um exemplo: na recente turnê de Liza Minelli, o cachê argentino foi quatro vezes maior que o brasileiro.
Viabilizar patrocinadores numa turnê desse tipo pode ser uma aventura complicada. Uma fábula ilustrativa é a vinda de Michael Jackson. Tudo começou quando Marlene Mattos, empresária de Xuxa e responsável pela vinda do cantor ao Brasil, viu o show em Madri, no ano passado. Marlene gostou. Ficou sabendo, por intermédio do amigo Pino Sagliocco, produtor italiano de shows, que Jackson incluiria a América Latina na turnê. Enviou uma proposta à Mamma Concert. Concorrendo com seus produtores sul-americanas e cinquenta de outros países, Marlene Mattos foi escolhida, junto com a DC-7 de Dody Sirena. O preço: 1,2 milhão de dólares pelos dois shows, fora gastos com hospedagem, transporte, segurança, divulgação, aluguel e impostos. Para cobrir os gastos, buscou-se o patrocínio da Nestlé, mas o produto que seria anunciado, o Supligen, foi vetado pela Pepsi por ser bebida e concorrer no mesmo segmento, o adolescente. Assim, obteve-se um patrocínio apenas parcial da Nestlé, de 600.000 dólares, e o resto teve de ser arrecadado junto a vários outros parceiros, numa operação trabalhosa.
AUTOMISTÉRIO E ESCÂNDALO - Caçadores de manchetes com estilos distintos, Madonna e Michael Jackson também são artistas de estatura diferenciada. Jackson é recordista mundial de vendas de um só disco (40 milhões de cópias de
Thriller), e seu último LP,
Dangerous, vendeu 20 milhões de cópias em pouco mais de um ano, 350.000 só no Brasil. Os números de Madonna são de outra ordem. Seu último disco,
Erotica, vendeu 3,6 milhões de exemplares no mundo inteiro, 110.000 no Brasil. Os dois artistas, por motivos diferentes, estão na berlinda. Madonna por estrear um show novo. Sempre que isso acontece, críticos musicais do mundo inteiro lançam a previsão de que dessa vez começou a decadência de sua carreira. Disseram que isso ia acontecer em Londres e depois em Paris. Em Londres, foi necessário improvisar um segundo show, tamanha a procura de ingressos. E em Paris, onde Madonna se apresentou mais de uma vez na carreira, a platéia não fez feio.
Mas Madonna e Michael Jackson também são personagens bem diferentes. O cometa louro adora falar de sexo e estoura uma champanhe toda vez que provoca um escândalo. Michael Jackson cultiva o automistério, gosta de se portar como exemplo para a infância e mora num palácio batizado de Terra do Nunca. Suas namoradas sempre foram falsas como o talento dramático de Brooke Shields, sua grande amiga é a relações-públicas Liz Taylor e sua hipocondria é um caso para estudos acadêmicos. "Ele é mais um personagem do que um ser humano, pois não envelhece, não é negro nem branco e tem um tipo andrógino," define José Éboli, diretor de marketing da Sony no Brasil. O astro constrói essa personalidade pública desde que se separou dos Jackson Five, o grupo familiar com o qual esteve no Brasil em 1974, e sempre fez do bom comportamento seu melhor argumento para entrar nas casas de família mesmo enrolado na bandeira de um ritmo outrora endiabrado como o rock. Agora, não é mais assim.
A polícia de Los Angeles investiga a denúncia de que ele teria abusado sexualmente de um menino de 13 anos. Não foi só o público que ficou chocado. O próprio Michael Jackson sentiu o drama. "Ele passou por maus momentos, mas agora está se recuperando," afirma Rick Lawson, baterista que o acompanha na turnê. Na realidade, até o formidável patrimônio do astro sofreu uma ameaça de curto-circuito. Em 1989, a Pepsi tinha um comercial de 5 milhões de dólares com Madonna. Por causa da confusão em torno do clipe
Like a Prayer, em que fazia uma dança pornô antes de beijar a imagem de um santo, a empresa arquivou planos para contratá-la novamente. São outras as bases do contrato com Michael Jackson, mas é difícil prever as vantagens da manutenção do acerto caso as acusações venham a ser comprovadas. Trazidas a público às vésperas de uma apresentação na Tailândia, ao menos até aqui elas não afetaram seu prestígio. "O público está fazendo questão de ser mostrar solidário e comparece aos espetáculos para deixar claro que gosta dele," afirma o produtor Avram.
ENCONTRO HISTÓRICO - Os shows de Madonna e Michael Jackson podem ser um marco, também, da temporada de shows mais quente já realizada até hoje no Brasil. Ainda na fase de projetos, anunciam-se para os próximos meses turnês sul-americanas de artistas como Paul McCartney e Whitney Houston, além de atrações já candidatas ao troféu arroz-de-festa, como o Jethro Tull. Até agora, o único que confirmou sua vinda ao Brasil foi Peter Gabriel, que canta nesta quarta-feira em São Paulo, no Olympia, e no dia seguinte se apresenta no Imperator, no Rio. Gabriel tinha anunciado que traria sua backing vocal de luxo, Sinéad O' Connor, mas a cantora careca, em decadência desde que rasgou uma foto do papa João Paulo II na televisão americana, decidiu não mais vir à América do Sul depois que a Igreja Católica chilena tentou proibir que ela cantasse do lado de lá da cordilheira.
Pode-se dizer também que essa supertemporada brasileira de shows foi aberta em grande estilo na semana passada. Num show histórico, pela primeira vez Little Richard e Chuck Berry, que começaram toda essa agradável confusão musical, mediram forças no palco. De um lado, o guitarrista de passo de ganso que criou um estilo de tocar imitando o piano de blues, iniciando a dinastia dos guitar heroes. De outro, o pianista de toque martelado que contagiou o mundo com sua irreverência. Berry e Richard criaram o rock 'n' roll nos anos 50. Trinta anos depois, Michael Jackson e Madonna ampliaram essa boa idéia levando-a à dimensão do megaespetáculo. Tudo isso foi e será apreciado na primavera de 1993, a primeira em que o brasileiro não precisou sair de seu país para assistir às maiores atrações musicais do planeta.
Madonna
Show
3 de novembro (SP)
6 de novembro (RJ)
Local
Estádio do Morumbi/SP
Estádio do Maracanã/RJ
Cachê:
US$500.000
Ingressos à venda
245.000
Discos vendidos no Brasil
110.000 (LP
Erotica)
Michael Jackson
Show
16 e 17 de outubro
Local:
Estádio do Morumbi/SP
Cachê
US$1,2 milhão
Ingressos à venda
160.000
Discos vendidos no Brasil
350.000 (LP
Dangerous)
Fonte