quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

A Música

por Andréa Luisa Bucchile Faggion
em 2005




Primeiro uma confissão aos leitores, esta humilde colunista não agüenta mais ler moções de advogados, réplicas da promotoria, decisões do juiz, apelações a cortes superiores... Já era hora de voltarmos ao assunto que, infelizmente, acabou nos trazendo a esse mundo de intrigas e armações digno de um roteiro hollywoodiano. Senhoras e senhores, vamos falar de música!

E poderia ter se chamado "The Music". Seria muito apropriado, pois lembraria ao público que é tudo que importa. Mas chama-se "Michael Jackson: The Ultimate Collection", e o título também é merecido. Esta coleção definitiva é muito mais do que um passeio pelos grandes hits de Michael Jackson que preserva a memória do homem.

Nesta caixinha luxuosa de surpresas, Michael Jackson esnoba. Mostra que conquistou o reinado absoluto do pop sem sequer gastar toda a munição que tinha à sua disposição. Ele foi à luta com "Don't Stop 'Til You Get Enough" e se deu ao luxo de poupar os demais postulantes ao cetro de concorrerem com "Sunset Driver".

Ele já tinha sugerido que a Era Bad poderia ter rendido outro álbum, quando nos deixou ouvir "Fly Away" (para a qual, aliás, há duas versões, que é pra ser metido mesmo) e "Streetwalker". Agora, ele resolve tirar do baú não apenas "Cheater", mas também a incrível "Scared of the Moon", que nos força a pensar no absurdo enquanto a ouvimos: trata-se simplesmente de um clássico do pop que não era conhecido por ninguém até então.

E o que dizer da recente "Fall Again"? Ela nos tortura, porque nos faz pensar novamente no que a Era Invincible poderia ter sido. Se "Whatever Happens" apresentava um novo Michael, é em "Fall Again" que ele brilha.
 
Inevitável pensar com profundo desgosto que esse novo Michael tem que perder seu tempo se apresentando em audiências em vez de palcos.

E, por falar em audiências (fazer o que se elas existem?), elas servem ao menos para nos mostrar que Michael Jackson continua mais vivo do que nunca. A cada aparição, a mídia brasileira - que, diga-se de passagem, sabe tanto sobre o que se passa dentro da Corte quanto sabemos sobre o campeonato italiano de caça submarina (existe isso? pois é...) - se limita a noticiar a entrada de Jackson com um já batido "o Rei não perde a pose". E não perde mesmo! Mostrar altivez, sem arrogância - eis a maestria daquele em cuja cabeça a coroa não pesa, repousa naturalmente...

Seu figurino, interessante notar, não está ali para lançar moda. Se alguém freqüentar algum lugar usando um terno branco estilizado a la Jackson, será um concurso de sósias. Isto porque sua roupa, como tudo mais em sua atitude, está ali para demarcar sua majestade, para cravar um marco divisório entre ele e o comum dos mortais.

E para que serve este desvio todo do genial box set para a elegância no porte e na indumentária do Rei? Ora, quem não tem pensado no que virá após o julgamento? Pois a magia que o box set nos faz relembrar aliada à presença quase suntuosa de Michael Jackson exibida no entra e sai da Corte remete à esperança de que essa saga de dramas e tragédias possa se encerrar ainda com uma chave de ouro.

Não, esta colunista ainda não perdeu todo o juízo para estar sonhando com quebra de recordes ou uma volta à unanimidade perdida, até porque Nelson Rodrigues já fez o comentário definitivo sobre as unanimidades. Ela apenas não consegue ver Michael Jackson, em tempos de Usher, cantando para uns mil gatos pingados de bom gosto musical.
 
Jackson nunca foi erudito ou underground. Nunca o será! Ao contrário, é a própria personificação do conceito de artista de massa. Injusto também seria dizer, como mero consolo, que, em sendo intimista, seria então mais artista. E injusto não apenas pelo elitismo que impregna tal teoria, como se a verdadeira arte fosse privilégio digno da apreciação de poucos, notadamente daqueles poucos que se atribuem o direito de decidir o que é a verdadeira arte, é claro.

Mas a grande ofensa contida nessa teoria se faz à própria obra de Michael Jackson, que sempre foi popular, sem nunca ter se convertido ao populismo das fórmulas prontas extraídas das estatísticas ou mesmo às regras mais triviais do mercado. Ou seria a obra-prima "Who Is It?", com sua duração extravagante, uma canção para o mercado? Sem contar que outros desafios aos padrões das rádios fazem companhia a ela no que - doce paradoxo - se tornou um dos álbuns mais vendidos de todos os tempos. Então, senhoras e senhores, não venham me dizer que Michael Jackson deixará de se preocupar com o sucesso e será então mais "artista". Não insultem o homem que "artista" sempre foi!

Ainda além deste desespero comunicativo para com um público sem limites que compõe o "artista" Michael Jackson, faz parte de sua natureza, visto que ele não foi criado por Joe Jackson à toa, a mais extrema competitividade. Em seu punho cerrado ou no "V" da vitória, Jackson carrega muito mais do que a certeza da absolvição. Ele mostra o desejo de, uma vez mais, calar aqueles que decretaram seu fim.

Fonte:
EDCYHIS | MJJ Secret Lovers

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