quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Xcape

por Andréa Luisa Bucchile Faggion





Desde o início dos anos 80, surgem tentativas de explicar o fenômeno Michael Jackson. Talvez mais surpreendente do que o nível de interesse do público em geral por este ícone pop, mesmo depois de décadas de exposição, seja a fidelidade de sua base de fãs, mesmo depois de décadas de escândalos. Não é mais cool ser fã de Michael Jackson, no entanto, estamos aqui. Por quê? Nossa primeira inclinação é responder a esta pergunta com uma declaração de amor incondicional, elaborando uma verdadeira apologia das virtudes e habilidades de Michael. Nós o cultuaríamos, década após década, simplesmente porque, mais do que ninguém, ele mereceria ser objeto do nosso culto por seu talento fora do comum e sua conduta exemplar. O engano desta explicação é olhar primeiro para Michael e só depois para nós mesmos.

Em geral, por que há ídolos? Na adolescência, os pais são desafiados. Desaparece a figura do pai-herói e surge a necessidade de uma nova referência, uma nova figura de identificação para a formação da personalidade. Isto vale para Michael Jackson? Em certa escala, sim, mas é uma explicação que está longe de dar conta da composição de sua comunidade de fãs, afinal, muitos já passaram dos 30, 40 e a maioria ao menos já abandonou a adolescência, o que não impede que Michael tenha uma base de fãs, se não maior, ao menos mais leal do que qualquer ídolo teen. Mas por que adultos têm ídolos?
 
Um afixionado por automobilismo pode ter por ídolo Ayrton Senna, um amante da MPB pode ter por ídolo Chico Buarque. Isto quer dizer que Ayrton Senna e Chico Buarque realizam, ou ao menos aproximam muito, o que essas pessoas idealizam para suas respectivas atividades. Entretanto, você pode encontrar quem colecione, a preço de ouro, macacões e capacetes de Ayrton Senna, ou quem não falte a um único show de Chico Buarque, mas você não encontrará, para ídolo algum, uma comunidade organizada e obcecada como a formada por fãs de Michael Jackson. Voltamos então ao ponto: isto ocorre simplesmente por que Michael é "mais especial" que outros ídolos? Eu insistiria que, em um primeiro momento, a resposta ainda está mais na própria comunidade do que em Michael.

Quem são essas pessoas que passam horas diárias em fóruns discutindo, literalmente, desde supostas conspirações da mídia contra Michael até as veias do corpo do cantor? São pessoas de ambos os sexos e diferentes idades, religiões, nacionalidades, classes sociais, etc. O que as une em torno de Michael? Basta olhar o que essas pessoas construíram: um verdadeiro universo paralelo! É isto que elas buscam.

Não vou chamar esse universo de "mundo ilusório". Por mais que possam classificar a participação na comunidade como alienação frente aos problemas do cotidiano, o fato é que a comunidade existe e é tão real quanto o mundo do desemprego, contas a pagar, filas de banco, etc. Mas é justamente em função deste último mundo que essas pessoas construíram seu "planet jackson". Michael sempre teve consciência disso e sempre insistiu em um termo extremamente significativo para descrever sua missão no mundo: escapismo! Há quem se drogue, há quem vá ao cinema, há quem vá ao estádio de futebol... todos estão escapando.
 
Aqueles que participam da comunidade de fãs de Michael Jackson chegaram ao extremo de construir um mundo paralelo, com um sistema de crenças e relações políticas complexas, para esquecerem (apenas por algumas horas no caso dos ainda razoavelmente saudáveis) quem são, onde vivem, com quem vivem, por que vivem...

A próxima pergunta natural é: mas por que Michael e não um outro? A resposta é simples: na medida em que sua aparência, seu trabalho, seus hábitos, seu comportamento, sua residência, suas relações... enfim, sua vida se coloca à parte do mundo cotidiano que nos cerca, ele se torna a base perfeita para um universo paralelo que não nos lembre em nada a sociedade convencional, afinal, estamos aqui para esquecê-la. Isto não quer dizer que os membros da comunidade de fãs sejam todos infelizes e frustrados em seu cotidiano, quer dizer apenas que a vida cotidiana não basta para essas pessoas, da mesma forma que não basta para ninguém. Sempre nos falta algo, caso contrário Hollywood e o tráfico de drogas não estariam entre os negócios mais lucrativos do mundo. Também não somos necessariamente mais doentes do que os outros. Há quem faça uso recreativo de drogas e mantenha uma vida "normal" na maior parte do tempo, mas também há quem se torne um dependente químico e jamais retorne do mundo para o qual "viajou". Se você sabe dosar bem suas viagens ao "planet jackson", relaxe e aproveite! Você é normal (ou ao menos tão normal quanto os outros loucos que lhe cercam).

 EDCYHIS | MJJ Secret Lovers

 

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